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domingo, 4 de setembro de 2011

Fio quinze

A medida em que eu ia percebendo que eles já começavam a desconfiar do meu disfarce e finalmente iam me pegar, eu corri numa pressa de piscar os olhos, deixando para trás sem apego nenhum, minhas lindas sapatilhas vermelhas. Por incrível que me pareça, eu não olhava pra trás nem pra saber se estava longe ou perto de ser pega, eu estava completamente entregue a minha própria fuga, segurando a barra  de babados da saia chique que vestia, e desgarrada eu sorria toda maliciosa do vento, que passava desesperado pelos meus cabelos e ventas, meio curioso para onde é que moça tão bela ia por causa do medo, mas toda cheia de coragem? E sem parar, eu não entendia de fato porquê fugia deles, porém fugia com tanta certeza, que era prazeiroso sentir cada fiapo de grama sendo amassado pelos meus pés, e parecia que cada passo meu haveria de despistar quem me seguia, e parecia que aquelas pedrinhas a qualquer momento iriam furar minhas meias. Eu esqueci de dizer, por debaixo da saia  tudo estava revestido por uma meia calça preta de fio número quinze, um fio frágil para uma fuga tão emocionante, e que certamente seria fácil de rasgar, mas como era um sonho, e um sonho que era meu, as pedras podiam ser sentidas, e as meias jamais seriam furadas por causa desse mero detalhe. 
E eu corria toda impecável, sentindo um prazer imenso de estar sendo perseguida, porque intimamente eu sabia que não seria pega, e já distante e não cansada  logo me avisei de que haveria um precípicio, e que a única saída era se atirar aquela altura magnifica e de natureza deslumbrante, e meu coração saltando pela boca sem juízo, arrepiava todos os meus pêlos, e eu disparada achava estranho em como é que podia  nenhuma vaga ideia de morte aparecer? 
Se jogar dali era exageradamente muito normal, e feliz eu corria tendo uma certeza ingenua e assombrada de que quando eu ordenasse  Voe!  De braços abertos eu iria flutuar na velocidade que eu bem quisesse, na direção que viesse em mente, e céus! Lá estou eu sem gramas nos pés de cabeça na imensidão, chutei sem querer algumas pedras no embalo, e me flagrei preocupada, talvez pra sempre estarão a cair, pois eu não podia medir o tamanho daquela altura que sobrevoava, e me pairavam sérias dúvidas sobre uma possível medida infinita...e a medida que eu ia voando, já não importava se fugia.

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