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terça-feira, 9 de dezembro de 2014

pra sempre clandestino

Quase como uma menstruação inesperada, vem como um aborto repentino, cretino aborto espontâneo, forçado. Vem como um aborto que meu corpo joga pra fora, repugna e cospe.  Eu vomito, expulso alguns restos, retiro, não sei mais se é uma fuga, eu estava apenas correndo desde então, sempre pra bem longe, bem longe... e de longe mistérios, segredos, solidão daqueles planos invalidados, as nuvens do céu trazem meu próprio fantasma a despertar nos meus braços, óh minha menina que sangrava, óh minha menina confusa, óh minha menina bruta e condenada a dormir para sempre... tento  lembrá-la em meus braços em que tempo estamos, quantas horas se passaram desde lá, e como não tem mais razão para sentir tanto. Que triste, que triste, que triste eu sei melhor do que ninguém. Foi um tempo que passou devagar, arrastado, queimando toda a nossa pele,  foi um tempo em que o destino nos rasgou em mil verdades e mentiras que perfuraram meu corpo de uma vez, não me confunda com nosso medo, você me deixa assustada, tivemos coragem nas escadas, tivemos coragem nas perguntas todos os dias e também nas possibilidades de um tempo que para mesmo saindo sempre do lugar. Tenhamos coragem de enfrentar e continuar se possível dormindo em paz.
Em paz... sem duvidar... o caminho estava certo e certas coisas dessa vida são difíceis mesmo de explicar. Dou-lhe, dou-me, alguns dias, quero entender que o tempo presente não é mais lugar. Não cabe aqui, não cabe ali, não... em mais nenhum lugar... mas, puxa vida! Chega...chega como um assopro, emocionante, intuitivo, não posso mais me drogar... são tempos mais fáceis acredito. O inesperado foi quase um pedido, a memória um chamado, as vitórias passam a ser um encontro, numa regra velada, na existência secreta de um laço, que eu queria acreditar que não existe, que coisa...que coisa que ficou essa coisa, esse sentimento meio medroso e estúpido, uma espécie de aborto pra sempre clandestino, sem sangue, sem crescimento, sem vampiro e sem paixão, nós viramos um susto,  um espanto, um de onde vens, para onde vais, sem lugar, desprogramado, cretinos, espontâneos, forçados, meu corpo, meu corpo... 

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Meu refrigerante acabou.

A medida que fui percebendo que meu trabalho final ia terminando, um vazio imenso veio se aproximando de mim paralelamente a alegria missionária de estar concluindo os anos naquele lugar. Não podia preenchê-lo. O pior de tudo é que esse vazio eu realmente não podia preenchê-lo. Era um colonizador, arrogante e dominador desses incontroláveis da certeza de que talvez nunca mais me encontrarei com todas essas pessoas incríveis que conheci. Tem beleza peculiar, elas são lindas, diferentes e tão, ao mesmo tempo, iguais a mim, reunidas no mesmo local, com experiências parecidas, se conhecendo e tentando nos conhecer nas frustrações semelhantes, discussões e risadas confortáveis, pessoas com olhos de esperança, que entram no bloco, pintam o bloco, fotografam o bloco, dormem no bloco e também que vão pra trás do bloco sem medo de jogar conversa fora e liberdade pra dentro da cabeça. Eu queria que esse vazio fosse realmente embora mas não dá... é preciso aceitar o fim das coisas, para o clichê de novos começos. As vezes eu tenho raiva da vida. Parece que quando tudo vai bem, caminha ao lado o fim. Quando o clímax se aproxima, caminha ao lado o fim. Quando tanto pensamos que estamos a nos desvendar, e encontramos as pessoas certas! Caminha ao lado o fim da certeza... E guardarei fotos, lembranças, risadas, caronas, mas nada será páreo para a felicidade que terei de ter vivido perto desse universo, de reencontrar alguns novamente ou me perguntar por outros para todo o sempre sobre o que será que virou, sobre se ainda mantém um brilho no olhar.  
Eu torcia, sabe. Entre os recreios da escola, com meus tênis de menina e vontade, muita vontade de ter amiguinhos unidos ou como aquelas que eu via na tv. Mas infelizmente, minhas amizades na escola foram sempre desastrosas... enquanto uma maioria vê pureza e sinceridade numa dessas amizades de infância, eis que eu descubro amizades mesmo é no período da universidade, fora da minha terra natal, eis que eu descubro que era pra eu estar ali, me conhecer ali, ser admirada ali, com toda aquela gente, com toda aquela chance de dessa vez poder escolher quem realmente valesse a pena de se relacionar pra que eu crescesse e aprendesse algo que florescesse, ao mesmo tempo, além e completamente dentro de mim. 
Agora, é um passo solitário novamente... a distância meus amigos. a distância vem dizer que triste... parceiros, que chato... meus confidentes, até quando? Meus aliados de loucuras, estou pra sempre querendo lembrá-las de como cometemos e todos os nossos beijos, meus jovens, nossos abraços, risadas, os avisos e os bares, os avisos e os lares, os puxões de orelha, nossos corações costurados, nossos conselhos, as piadas, subverter, subverter! Vamos lembrar de tudo de bicicleta! E todos os significados dos nossos signos, dos cabelos, das barbas, das tatuagens... a cantina se fecha, não vou comparecer aquela festa, meus amigos...que triste...o meu refrigerante acabou.