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domingo, 30 de novembro de 2008

Gostaria muito de vê-la.


A menina vivia atrás daquele muro. Ninguém imaginava como ela era. Alguns espiavam em cima da árvore alta da esquina, mas pouco viam. Todos gostavam da voz, pelo menos a voz faziam idéia. Uns diziam que ela era feia, "Só pode!", pois nunca aparecera. Outros que era linda, tão linda que era capaz de decepcionar todo mundo por manter beleza demais e acabar por ser convencida. Mas de nada adiantava tamanhas suposições, a menina não aparecia para conclusões.
Ela cantava, sorria e de vez em quando gritava de felicidade, mas era tanta felicidade que alguns não aguentavam de curiosidade e faziam de tudo para escalar o muro e saber o que lhe trazia tantas gargalhadas. O muro não facilitava. Parecia ser feito de gelo, escorregadio! Nem escadas, nem as próprias mãos e nem mesmo qualquer outra forma de escalamento existente fazia alguém subir naquele muro. E os adultos não concordavam em quebrá-lo, era praticamente acabar com um patrimônio alheio e histórico da vizinhança. Claro que quem queria subir eram as crianças e os jovens, o pessoal mais velho já conseguiam seguir suas vidas com aquela curiosidade, e também já tinham tentado de tudo para ver a menina e não conseguindo preferiram desistir.
Algumas crianças choravam de raiva só de pensar que jamais conseguiriam vê-la. Os pais não sabiam o que fazer, porque por mais que lhes dessem palavras de esperança eles também foram vitimas da menina. Vitimas que fracassaram tanto na esperança como na prática.
Euripedes, o mais velho do bairro, tinha muita raiva da menina, mas raiva que as crianças. E olha que a raiva das crianças era enorme! Qualquer um podia sentir nos choros e gritos escandalosos que elas davam seguidos de manchas vermelhas no rosto e lágrimas violentas escorregando, como o muro da menina, pelas bochechas rosadas.
Um dia Euripedes cansado de toda aquela choradeira e curiosidade desesperadora da vizinhança, resolveu fazer uma reunião com as crianças, dizia: "Quem aqui gostaria de ver a menina do muro escorregadio?" as crianças começaram a ficar agitadas, umas começaram a chorar de soluçar outras a dizer que aquilo não tinha graça e os jovens perguntavam o porquê sem parar. Euripedes não fez por mal, gostaria apenas de iniciar a reunião descobrindo quem ali ainda tinha esperança, as crianças saíram chorando para suas casas e alguns jovens o chingaram. Ele então, se viu velho e quase morto, foi então que resolveu que pelo menos ver a menina ele deveria, já que da vida não esperava mais nada a não ser aquilo.
Foi até o muro e perguntou: "Menina! Menina! Por que tanto ri?" , fez uma sequência de perguntas sem parar, quem passava dizia que ele havia se tornado por fim um velho caduco, ele praticamente falava com o muro, ela apenas cantava, sorria e cantava, às vezes parava como se dormisse ou comesse, mas depois começava, ele então jogou algumas pedras no muro, mas as pedras deslizavam, ele então abraçou o muro e disse: "Menina, estou velho quase morto e gostaria muito de vê-la." o céu ficou cinza, as crianças foram chamadas pelos pais para se protegeram do temporal que chegaria, alguns moradores pediram a Euripedes que fosse para casa e largasse de loucura, uma voz de menino novo, gritou lá da outra esquina: "Ela está pegando uma escada!", e Euripedes por fim pensou mesmo que a menina apareceria de trás daquele muro, pôde ver até um pedaçinho de cabeça chegando, ficou ansioso e então o pedaçinho sumiu. Ele gritou para o menino de voz nova: "O que ela está fazendo? Desistiu?" ele então disse: "Me parece que foi buscar alguma coisa!"
Mas uma hora se passou, o menino ficou com fome e desceu da àrvore. Triste, o velho, com menos raiva, quase se conformou, quando por fim, um balão vermelho lentamente saiu de trás do muro. O velho sorriu e disse: "Só um balão minha querida? Ah!" e conformado saiu.
O menino com um sanduiche na mão voltando para ver o velho, viu a cena e se decepcionou com o velho desistindo depois de tanta "caducação". Soltou o sanduiche no chão e correu rápido, num salto! Pegou o balão!
O balão o levou para cima e ele viu a menina, "Óh! Mas que menina..." parou e pensou de súbito, "Como eu vou descer?"
Não tinha conseguido pegar o balão, na verdade, não quis.
"Ainda bem que eu não peguei esse balão." e terminou o sanduíche.
No outro dia, o muro estava quebrado e não tinha mais menina nem nada.

Um comentário:

Anônimo disse...

Sur-pre-en-den-te! A cada conto, menos palavras tenho para expressar o que sinto lendo-os! Parabéns, gatinha! (Mas uma revisão de fluência seria interessante.)