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quinta-feira, 1 de novembro de 2018

Traição

Não é mais a pele dele que incendeia meu corpo. Mas eu precisava conversar com quem não me conhecesse tanto, com quem apenas conhecesse uma parte minha que eu gosto que seja vista. As vezes me canso de ser tão crua, de ser tão inteira e de estar num destino um tanto previsível. Me sinto tão egoísta agora. Mas meu desejo ali era encontrá-lo porque sei que não espera nada de mim. Por algum motivo, era com ele que eu precisava conversar. Porque já tivemos algum encanto e porque de fato isso já me deixou bem anos atrás... é com quem eu já sabia que dava certo foder. E fodemos. Quando nossos olhos se encontraram, até esqueci que era traição. Fiquei leve, como era antes. Quis te abraçar e fui abraçada antes mesmo de pedir. Ele gosta de mim tanto quanto eu. Batemos um bom papo, foi um lindo abraço e duas horas se passaram muito rapidamente. Como sempre ele mora em lugares esquisitos com pessoas misteriosas. E é impressionante como não me incomodo nessas horas. Sem mudar minha vida e sem fazer planos, nosso encontro é sempre com essa regra não falada. O tempo pareceu que havia voltado para uma época aonde meu destino era só meu, da liberdade e principalmente da minha iluminada solidão. Ri das histórias dele. Acho que dessa vez ele esteve com pessoas importantes e nem sabe. Sempre solto, sempre leve, sempre andarilho. Isso algumas vezes me é excitante... me sinto mais jovem e quase imortal. Sou quase uma espécie de vampira com ele. Não tomei iniciativa, de alguma maneira é charmoso ser assim com os homens. Ainda estava em dúvida se teria coragem para encostar meus lábios no dele. Não parecia adequado apesar de sentir vontade. Ele me beijou de supetão e como antes, não beija muito bem. Disse na hora, porque não consigo ser desonesta. Ele riu como sempre e disse junto comigo parecendo uma criança como ainda babava um pouco e parecia meio descontrolado e tinha o bigode e a barba cheirando cigarro paiêro...
Quando tiramos as roupas e encostou no meu corpo, senti como sentia antes... uma ardência nos meus braços e as partes de baixo derretendo, ainda que tuas mãos não fossem macias como a dela. De fato, eu não estava totalmente ali como antes. Havia a presença dela comigo e comparei diversas vezes. Gostei de te dar prazer e calafrios, das minhas performances através dos teus olhares, mas tive mais certeza que furaria meu dedo e faria um pacto apenas com ela.
Te abracei e desabafei sobre eu e ela no teu peito, percebi que tu tem medo que eu comente com tanta sinceridade e amor sobre ela, mas aos poucos também percebi que tu entende que não tem nada a ver com a gente. No fundo você sabe que tem um lugar especial, ainda que não seja protagonista da cena do meu coração. Por outro lado, também não queria me sentir vadia, traiçoeira e cara de pau... era uma forma de ser tua amiga e não amante.
Quando chegou na minha parte preferida, comparei novamente. Lembrei dela e até tentei disfarçar. Quem sabe se eu imaginasse que fosse ela, não chegaria com mais facilidade... mas não era, e não cheguei. Disfarcei amigavelmente. Havia me esquecido também como era fingir com os homens nessas horas. Depois dela não fingi mais nenhuma vez. É como se não precisasse... é como se fosse inevitável não chegar também. Dessa vez não fui honesta contigo, não queria que fizesse esforço pra me agradar. Fiquei constrangida por todo aquele plano em vão. Afinal de contas, o que diabos eu queria de fato? Matar uma saudade que não existe desse tanto? Resgatar sensações que já conheço? Ou amá-la profundamente do avesso?
Chamei o carro e você pareceu um pouco triste e com raiva da minha pressa. Não fique assim, eu disse carinhosamente. A gente sempre vai se ver uma hora ou outra, tentei ser divertida. Eu sei, eu sei... ele disse e foi tentando me esquecer antes mesmo que eu me fosse, quando acendeu seu paiêro. Sentados, vendo a lua, esperando o carro comigo na calçada, foi engraçado quando ele pediu permissão para colocar as mãos ao redor da minha cintura, como se a qualquer momento eu pudesse escapar. Besta! Eu disse sorrindo me sentindo um pouco ruim... - meu deus, até agorinha estávamos cheios de intimidade no colchão! Você deu uma gargalhada e quebramos o gelo da situação.Eu gosto muito dela, pensei ao entrar no carro e dar tchau pra ele através do vidro, apagando toda a situação.   

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