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quinta-feira, 1 de novembro de 2018

Queria voltar a escrever como antes. Deslanchando, interrompendo, pensando no hoje como se fosse amanhã, pensando no amanhã por causa do ontem, eu queria de novo daquele jeito. Era todo espontâneo, todo original, criativo, clássico e moderno ao mesmo tempo... Ah, como era gostoso ser eu! Depois de um tempo fui ficando mais óbvia e tudo tão mais claro... Bom mesmo era quando era misteriosa, agora é como se eu possuísse tintas e várias latas de tintas de uma estante que tem em toda casa. Sabe toda loja? E a paleta, e aquela cor desgraçada que todo mundo gosta, todo mundo tem, todo mundo conhece e namora...
Antes não, antes eu não sabia o preço, o nome, a origem... eu não sabia nem o nome da cor e pintava. Agora que tudo sei, nada mais sei...
Sobraram em mim resquício desse tempo profundo, eu pinto uma árvore no meu quarto adulto. Antes um cenário pra tantos medos e fantasias, agora mais sério e confortável, mas com uma árvore que eu inventei. Ela começa em um dos cantos dos quadrados que eu chamo de parede. Enxergo e crio seus troncos como se saíssem do lugar misterioso que já me teve...e os pinto atravessando as paredes como veias cheias de sangue, entende? Como vida ou veneno de cobra procurando contaminar a vida que pulsa de um corpo cansado, demo dê que não encontra tempo, pensa em contas para pagar e não encontra flores e folhagens a não ser que se pinte.
É até aí que o tronco pode ir. Com azul e lilás, crio uma vegetação raríssima do meu cerrado imaginário. Foi eu que criei, eu posso escolher. Sou dona e proprietária dessa semente que germina e de vez em quando cresce, cresce e aparece em outro canto do meu quadrado...minhas paredes. Aliás, quem inventou que os quartos haveriam de ser quadrados? Me faço essa pergunta como se ainda fosse jovem pra me preocupar com esse tipo de curiosidade...E imagino pintando que as folhagens sejam redondas e macias. Imagino tocando-as caso fossem de verdade. Meio algodão, meio um doce de açúcar se desmanchando... Então eu paro pra descansar e a árvore crescer. Nessa parte minha árvore é igual as demais... demora a crescer.


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