Páginas

quinta-feira, 1 de novembro de 2018

o sopro

Não sei mais escrever.
Há dez anos atrás, sem técnicas, sem algumas cicatrizes sérias na alma, sem trabalho e instituições entrando pelas minhas veias como droga, eu... eu fui gênia.
Talvez seja mais fácil olhar para trás e dizer que tudo era bom.
Com o tempo também adulteramos memórias sem perceber.
Pra ser menos duro, ou pra alguma única vez na vida ser mais fácil.
Hoje, sou pureza com sonhos perturbados, confusos e esvoaçantes que bateram naquele peito.
Não sinto falta. Não voltaria no tempo. Mas eu sabia tanto sem saber de nadinha... Dez anos.
Vinte e sete e com dezessete, recordo-me como parecia tão mais sagaz...
Sabia tanto sobre mim, hoje sempre irritada, paranoica e cansada, tento não saber.
Dez anos e nenhum suicídio, dez anos e nenhuma carta na manga, dez anos e alguns fantasmas colecionados, dez anos e algumas decepções, perca de cabelo, peitos caindo...ah, a vida que naquela época havia tanta sede...
Quantas mudanças sem sentido,
quantos caminhos sem saber para onde ia e porquê,
quantas estradas sem nenhuma escolha própria,
sem consciência... nunca soube, não é mesmo? O meu lugar. Meu paradeiro. De que grupo eu realmente fazia parte. Sempre soube ao mesmo tempo que não era possível ter certeza de nada. Fico triste, por não saber mais escrever, não saber mais criar, não saber mais ler, ouvir, não saber mais dizer como antes, escutar como antes...o sopro é a vida. 

Nenhum comentário: