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quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Quando a companhia chegar.

Eu espero que a companhia de dança não demore a chegar. Espero desde que nasci. É por isso que eu tenho que ser boa na dança, ou bonita, para não ter nenhuma desculpa, assim, serei encontrada para todo sempre. Para cada turnê, por cada lugar. Talvez eu não esteja fugindo com eles, talvez eu esteja fugindo de mim, mas isso nem importa, o que me importa mesmo é eu não dar nenhuma explicação, e deixar um único bilhete com letras recortadas de jornais, para que minha letra não seja interpretada, e sem meu endereço, e sem foto de despedida, porque assim farei com que se esqueçam mais rápido de mim. E nesse nunca mais ver ninguém, ou nunca mais voltar, apesar de que íntrisecamente eu sinto que será preciso um dia voltar pela dor ou pelo amor, eu vou continuar, e viver miseravelmente com a arte. Quem sabe, viver somente pela arte. E sobreviver como todo mundo sobrevive, de saudade.
Acredito que haverá pessoas de histórias de vida diferentes, de histórias de fugas diferentes, ou as sem oportunidade, que já nascerão nessa fuga. Dentre eles, uns gostarão de mim e outros nunca vão me aceitar, mas me suportarão pelo tempo, e um dia até me pedirão favores importantes, o que não signifique que por fim deixarão de transparecer o quanto eu nunca serei importante. Isso não será preocupante, em todo lugar isso acontece, a companhia é só mais um desses lugares. Os experientes querendo que os novos sejam frustrados antes do tempo, e os jovens querendo que os velhos sejam esperançosos depois do tempo. E o mais engraçado é que só assim tudo consegue andar para frente. Não posso reclamar, porque serão da companhia, o que implica que todos somos um, e um somos todos, inclusive! Deve existir mosqueteiros lá! Não posso reclamar em segundo, porque serão a minha maior companhia. Desconfio que os espelhos do camarim serão amaldiçoados, o ar melancólico aparecerá por qualquer um que se olhe, mesmo que estejam apenas procurando a perfeição do novo espetáculo. E quando os artistas, ou quem quer que esteja para subir no palco já nem queiram mais procurar pelos espelhos, ou por eles mesmos, e estivermos muito apressados e sobre muita pressão, eu serei chamada para ajudar, já que pretendo ser uma das primeiras a estar pronta para dançar, por conta da minha empolgação jovial de estar vivendo um sonho, pintarei os olhos das bailarinas amigas, percebendo sempre alguma coisa perdida, mas não ousarei em perguntar. E até nos palhaços, que me exigirão expressão nos pincéis e cores, tornando-se chatos, eu perceberei o fingir tanta alegria. Aposto ainda, que vai haver uma vez e um insuportável. Um que conseguirá perturbar meu juízo só piscando. Todo colorido, ele que vai me dizer, depois que eu, cansada, querer irritá-lo falando da falsa alegria, que eu sou muito juíza, que a alegria dele não é falsa, e sim precisa, e que chatice não significa que não há verdadeira alegria, mas sim disciplina. Me ensinando muito sobre todas as técnicas que eu não conseguia ver, e como piada, ele vai despertar minha falsa ideia, de que tudo que está por trás do brilho é falso, e me corrigirá dizendo que a verdade é que é arduamente trabalhado, e parece falso porque todos ficam sérios, e me explicando sem eu perguntar, dirá que seriedade ajuda.
As cortinas se abrirão, a música vai soar, e sem observar cada um do público, porque não dá tempo, eu e minhas companheiras dançaremos iguaizinhas até o final, e de imediato, receberemos assobios que me farão observar tímida e sorridente meus próprios pêlinhos dos braços subindo, e só não verei os das pernas, por causa das meias, meias que eu mesma vou lavar! E que escondem o quanto somos humanas, porque lá em cima, não queremos ser assim, queremos ser mais!
E quando fizermos a pose de despedida, gritarão, e viraremos milhares de fotografias, que jamais vamos ver, entretanto viraremos, e seremos eternizadas e para sempre, se não desbotar, papéis felizes.

Um comentário:

NaNa Caê disse...

eu traduzo: bailarinas sofrem