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terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Caolha por opção

Abriu um olho só, o outro não abria por causa das lágrimas do dia anterior. Ontem, enquanto seus olhos decidiam se queriam chorar até não poder mais, ou se dormiam, o corpo cansado e o coração indeciso, decidiram que no dia seguinte os olhos acordariam inchados. No decorrer da noite, enquanto tentava sonhar, as lágrimas foram lentamente amarelando-se e transformando o líquido salgado em remelas, que conseguiu fazer com que os cílios de baixo finalmente descem descanso as réplicas dos cílios de cima, e como num beijo obcecado, os olhos grudaram. Talvez, tivesse um entupimento no buraco do olho esquerdo. Seria a única explicação para dois olhos chorosos pararem de chorar e apenas o olho direito acordar remelento e fechado.  
Com aquele único olho aberto, já de manhã, viu um raio de sol infestando com calor suas pernas fora do cobertor. Lembrou que se esquecera de fechar a cortina antes de se jogar na cama aos prantos, e ao recordar do motivo do choro, fechou seu único olho envergonhada e o estomago vibrou o pano fino da camisola. Passando a mão na barriga confusa, não sabia se já era fome ou mais um enjoou matinal.          
Determinada a descer para cozinha e encarar um novo dia, disse para si mesma que não foi feita para manhãs, que o sol a entediava e desceu as escadas contando as paredes o quanto odiava morrer de calor. O tempo estava sendo o senhor da razão, só se entretendo com o tempo para se esquecer das picuinhas emocionais.             
Decidiu na beira da pia quando escovava o céu da boca impressionada com a imagem de si mesma caolha, de que não, não ia despregar o olho. Ficaria caolha enquanto pudesse. E foi a maneira que encontrou do dia ser verdadeiramente um novo dia.
Sem gasolina, irritou-se novamente lembrando da noite anterior, e respirou fundo estremecendo o corpo inteiro de um calor desconfortável. Como sempre fazia favores numa boa, e o vizinho era uma rara espécie da rua de características gentis, não viu problemas em perguntar se ele podia trazer um pouco de gasolina do posto mais perto para ela poder se locomover. 
O vizinho possuia olhar direto mas depois ficou olhando-a de rabo de olho, talvez estivesse assustado com o olho pregado. É de se desconfiar que setenta por cento da decisão de ajudá-la tenha sido por dó, preocupação e curiosidade pelo que teria acontecido para aquela moça até bonitinha decidir que aquele dia veria o mundo por apenas um ponto de vista.
Depois de agradecer o favor, percorreu alguns kilometros até o bosque da cidade e sentou-se num lugar perto de flores roxas luxuosíssimas. Tirou da bolsa velha milhares de papéis perfumados e tentou picotá-los depois de sete dobradas, difícil... não conseguiu. Depois se lembrou que era como estar dobrando sete árvores, algum professor lhe disse isso uma vez.  
Alguns cílios já se despregavam sozinhos e faziam força pra pestanejar e despertar a paz do olho fechado da caolha infeliz. Agora, Sueli começava a rir pela primeira vez nessa história, é que parou pra pensar e achou graça da coincidência de como se planta árvore e sentimento  e de como também se arranca árvore e sentimento, e de como planta-se sentimento em papéis . Deitou harmônica em meio as flores luxuosas e o olho aberto  se juntou ao pregado e se fechou. Só a boca estava aberta agora.

(Esta história é dedicada as árvores que caem para virar papel que muitos usam pra despejar sentimento humano. E aos primeiros bastardos também, os Ciclopes.)

Um comentário:

Babi Paixão disse...

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