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segunda-feira, 20 de setembro de 2010

O Homem


Protegia o nome dele por amor. Não era em codinome beija flor, mas era uma ave que não voava. Ele nunca pareceu ser do tipo que quisesse voar, e também, ela acabou esquecendo de perguntar sua opinião sobre flores, mas mesmo assim o fez, e então ele era ave. Ela percebia nas entrelinhas que ele era mais sensível que um casal que acabará de descobrir que antes tudo fora ilusão e agora sim! Agora sim era amor. Demorou um pouco, mas hoje ele já podia dizer que a odiava, sem desesperá-la, porque ela aceitou que não queria mais entender quando ele estava vestido de homem espelho. Tudo começou quando ela dormiu e o encontrou nos sonhos, meses sim e meses não, se assustou muito quando intuiu que acordava feliz e tão tão mais feliz. “Os olhos estavam lá!”, suspirava, “Tristes do jeito que é na foto”. Ela nunca entendeu porque a melancolia dele a esquentava tanto. Mais tarde abordou a teoria de que talvez fosse porque assim, destruía com rebeldia aquela vida bela que a novela tanto a queria fazer acreditar que era a única que existia. Acordava desejando lê-lo, preparando-se para escrever, ansiando pela presença invisível, procurando um jeito de seduzi-lo sendo primeiro o que sempre desejou, uma grande e atraente amiga, eles tinham tempo no virtual. O mais engraçado era que ela não precisava disso, mas queria por bem ou por mal, e se fosse preciso se rastejava e sangrava sem problemas, porque havia uma diferença naquele envolvimento, havia mistério, uma gentileza e cavalheirismo do século 19 que a fazia enxergar tudo em preto e branco. A distância enorme, era altamente incrível e contraditória, pois os fez se conhecerem interiormente como nunca se mostrariam na vida. Ela era lembrada por ele, por nunca esquecer nada. Ele não era esquecido por ela, por sempre esquecer tudo. E escrever era ótimo, com ele vagando, um desafio enrustido e apaixonado. “Não minta para mim, você sabe que temos uma intimidade deliciosa desde o primeiro momento”, se dizia cautelosa e poucas vezes para ele. E era verdade, foi amor a primeira frase, talvez não tivessem química, nem física, muito menos biologia, mas aquele história do chá envenenado... a fez se perguntar muitas vezes quem tomara o chá errado. Ela não tinha mais concentração, tinha vontade de conhecer, ler e saber sempre mais, só por causa dele, só por causa dela, só para terem assunto e saber o que ele também pensava. Era meio doentio, mas era uma febre rápida que preenchia o grande vazio. Ele a desesperava cada vez que desaparecia ou aparecia mais desanimado, nervoso, reclamando da mãe, complicado e chato de propósito. Dizia que ela não costumava falar de si mesma, e era fato, ela achava que apesar de ter estórias encantadoras, era normal demais, e por isso só o deixava falar, mas seria inútil, ele não lembrava de quase nada...então, ela carregava-se de seus desabafos, e ele saia leve sem lembranças de quem escutou. No fundo, os dois queriam que dessem certo. No fundo sabiam que seriam intensos, extremos, aquele amor de livro e feitos exatamente um para o outro. Porém, no raso jamais daria certo, no raso jamais se afogariam e provavelmente... "Como você sabe?", ela começava disposta, negando a covarde crença dele. Longe, os “te amo” mesmo assim eram sinceros e benditos, não selavam os corpos, mas selavam as cartas e ela se olhava no espelho suspirando se ele estava vivo ou morto aquela hora. Se ele era feio, não a interessava, se ele era triste, muito menos, virara obsessão. Na pia, no almoço, no fim da tarde, no entregar dos documentos. “Por que e para que tive olhos tão grandes por você?”, respirava abalada. Friamente chegou o finalmente, ela insistiu e ele disse que era só, que era pouco, que precisava apenas de uma dama de azul e ficou claro que ele a preferia de peixe nadando no árquario do que sendo por fim comida de gato. Os olhos dela atrelaram-se, um olho no peixe e o outro no gato e não queria mais cuidar dele. A cabeça quase quebrou para matá-lo de dentro, a imaginação era fértil demais, foi complicado! E a obsessão a enchia de possibilidades tendenciosas para explicar as atitudes dele para si mesma. “Nunca ia dar certo?!” gritou em busca de lágrimas. E quando ninguém respondeu e se viu sozinha, viu que era a mesma desde o início, que talvez fosse só platônico mesmo, e se respondeu sem choro:


-Nunca foi certo, recomponha-se.

Um comentário:

isao disse...

até agora, o que mais gostei, acho.