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quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

mal comida

Ficou com aquele cheiro de pau no corpo até o dia seguinte, mesmo tomando um banho. Tomou banho esfregando e pensando "não sai, essa porra!". Na verdade é que não foi bom. E quando não era bom, mais do que a lembrança, ela tinha a sensação de que estava com ele. Era sempre assim quando era bom e quando não era bom. Ainda tinha aquela mania estranha de achar que um pedaço invisível da pessoa acabou vindo com ela como sombra. 

Também não sabia dizer que tinha sido péssimo. Nem pra si mesma, nem pra ele. É que havia muito tempo que não fazia. Era pra ter sido bom, pra ser comemorado, pra ser contado para as amigas mais próximas. Talvez, pudesse ter sido até um possível namorado. Mas, não. Apesar da beleza, do perfume, da altura... pareceu por um momento valer a pena ir ao encontro. 

Há sexos e sexos, e para a surpresa dela, não se sentiu nem gostosa, como antes se sentirá com caras não tão bonitos. Já havia tido sexos não excelentes, sexos sem amor,  interrompidos, que davam medo de se apaixonar, que davam vontade de engravidar, que dava, dava, dava e queria ser ainda mais uma doce vagabunda... 

O problema desse é que o pau era claramente o centro do acontecimento. Não dava cena. Ainda que mudassem as posições, os jeitos e trejeitos. Até tentar se tocar o incomodou. Ela não era sequer figurante da cena. 

Ela não sabia direito nem se tinha que ser submissa. Tem atos que de tão péssimos dão preguiça e confusão para reagir. Poucas vezes na vida foi submissa e ainda que fosse foi por conta própria. Ludibriar que se é algo também é uma boa estratégia para sentir prazer de vez em quando. Mas não era esse o contexto, infelizmente. Motivo estranho, esse também de ser inteligente demais a ponto de ser fingida. 

O fato é que não havia aproveitado, não sentiu prazer, não quis se quer rever. Também não o tratou mal, nem ficou querendo ensinar. Não queria muita conversa, nem assunto, nem amizade. Só se despedir e tomar um banho mesmo. Alguém haveria de ter culpa? Que sexo ruim, que sexo péssimo, que falta de química. Até ler um manual de instruções teria sido mais interessante. 

Ele tinha papo, tinha tamanho, documento, atitude, local, privacidade, cabelo, emprego, diploma, estava limpo, falava português, tinha telefone, as roupas em perfeito estado, chegou a olhar para o decote dela, dando-lhe uma faísca de esperança maliciosa de que era um comedor daqueles que se lambuzam e curtem um molho... Mas, tudo não passou de uma grande expectativa de quem há muito tempo não era comida. 

Era perfeito, se soubesse comer o corpo de uma mulher. 
Era difícil demais pra ele, difícil demais.

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