Postagens

Mostrando postagens de março, 2011

Louca por tomate

Imagem
Desde o dia que se achou uma bobagem em carne e osso, parou de escrever. Achou quem sabe que as minúncias vindas da respiração, provindas da inspiração, só saiam pelas canetas gerando filhinhos e filhinhas abobados. Numa sucessão de escritos tolos, numa sucessão de mentiras picaretas, numa sucessão de verdades vagas, numa sucessão de indecisões tapadas, parou de escrever. E do dinheiro que guardava, nunca mais se tentou em entrar numa papelaria, se segurou para não comprar o primeiro caderno bonito, em branco, livre, e pronto para ser preenchido, com suas bobagens imbecis e esquizôfrenicas.  Como o tomate deixa de ser inteiro num vinagrete, a cabeça pois-se a crescer, crescer e crescer, de tanta bobagem. As mãos orientadas pela certeza da cabeça, de que era tudo pura bobagem, não conseguiu seduzir nenhuma caneta preta, nenhuma caneta azul, nenhuma caneta vermelha. E sem as mãos com uma caneta, não cortava aquelas bobagens em picadinho, como o vinagrete é e o tomate inteiro não. E a...

Missão corporal

Coração, Preciso conversar com você, sei que não é cabeça para estar aberto, sei que é sensível e muitas vezes está com o tempo cheio para cuidar das mágoas, mas queria que não fosse injusto e falasse comigo. O estômago disse, que deixa vários recados contigo, e que não os dá importância, mesmo que alguns possam ser besteira, isto não é nada bom, porque não só ele como a pele, veio reclamar por alto sobre as espinhas, as quais nunca foram comuns neste corpo, e que andam brotando feito botões vermelhos de rosas espinhosas, nas bochechas e costas. A causa disso não pode ser alimentação, se não o estômago teria dito algo.   A fraqueza das unhas também é outra infelicidade, andam fáceis de se quebrar, como se fossem papéis, e reclamam constantemente que quando conseguem se firmar ou endurecer, a boca teima em arrancá-las sem permissão e freneticamente até as deixarem no toco dos dedos.   Por causa disso fui conversar com a boca, e ela disse que faz sem nem perceber, e ...

A culpa é da saliva

Entrou na sala do Dr. Aristissabal, aquela mulher magrela com um pequeno espaço entre a arcária dos dentes da frente. A coitada era mais bonita sem sorrir, isto era triste, mas bonito. Chegou, sentou, e não mudou de posição nenhuma vez sequer, desde o encontro das ancas a poltrona roxa fúnebre que não lhe agradava, e deixou claro logo que chegou. -Quem escolheu essa cor doutor? -Cor? -Sim. Desta poltrona que terei que sentar. -Bom, nem me lembro mais...está aqui tem um tempo, lhe incomoda? -Desagradável. Roía as unhas. Como minha comida revira no estômago, ela roia as unhas. E sua imaginação não evitava lembranças que não lhe perteciam, parecia um poço cheio de moedas e desejos alheios. Os pés balançavam no monólogo inteiro.  -É como se roer as unhas me desse longo prazo para me destruir vagarosamente. -Precisa de um prazo? O doutor não se conteve de ver um corvo num dia frio do quadro da parede, sair voando e pousar em sua cabeça.  -Então, roe para combinar com a suspeita de ...