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terça-feira, 2 de outubro de 2018

saudade as vezes

minha saudade era imensa de vocês.
mas eu não podia dizer, de alguma forma eu também queria ser livre como a versão que guardei de vocês...
jovens, livres. 
ela talvez nem tanto, 
você absolutamente. 
quando eu andava por aquelas ruas sozinha, imaginava que estavam comigo, a versão jovem de vocês. 
a que tinha cds, 
a que sabia a letra das músicas, 
a que lia livros em várias posições...
era obcecada por vocês. 
pelo amor não correspondido, 
pelas traições contadas, 
por não se largarem, 
por serem imperfeitos, 
por um ser preto e outro branco, admito. 
talvez nao conscientemente, mas eu era obcecada por vocês. 
sinto vocês correndo nas minhas veias, mais do que nas veias dos meus irmãos...
é patologia...
é filosofia
é fisionomia
quando eu ando na rua eles dizem que sou a cara de um 
o fucinho do outro
nunca um só...
sempre sou os dois
sempre os dois.
eu assistia minhas aulas pensando que o curso era cara de vocês
pensando que aquilo era fácil demais por ter nascido de vocês
eu pulava carnaval, 
e tomava muita cerveja
eu pensava muito em vocês quando encontrava aquela galera animada 
eu os via o tempo inteiro!
sentia uma vontade imensa de ser amiga de vocês
ter a mesma idade
ter vivido o mesmo tempo
ter os mesmos amigos
ter mudado o tempo
o encontro
a hierarquia...
os vejo e escuto no rádio
nos casais jovens de humanas
me enxergo nos pequenos bebês com pais livres e jovens como vocês...
eu os via nos músicos e no som dos tambores, e imaginava o que diriam...? 
Como estariam vestidos, 
como iriam sorrir e me contar alguma curiosidade universal que abriria minha mente para tantas ideias precipitadas para minha idade e estragaria meu processo de pureza de uma só vez!
Guardei vocês dentro de mim, guardo... não consigo perder!
Ah... eu gostava tanto de vocês, tanto! 
Mas não podia dizer, por alguma razão estranha...
eu também queria ser livre como a versão que guardei de vocês. 
Até hoje, e ontem e amanhã!
Ouço as músicas que ouvia quando sou criança, 
tento encontrá-los em outras pessoas, 
agora eu percebo.
tentei viver histórias parecidas com a de vocês, 
agora relembro.
encontrar a mesma turma, 
o mesmo sonho, 
amigos parecidos... 
ser vocês de alguma maneira. 
E todos os meus sapatos, 
minhas roupas, 
meus cabelos, 
tudo! 
Tudo foi criando a forma de vocês misturadas...
talvez, talvez eu fosse os dois juntos! 
Quem sabe eu não pudesse correr e correr...ah! 
Houve um tempo que eu achava que nunca os superaria...
mas eu superei...e inevitavelmente vocês também não pararam no tempo e seguem comigo...
É como se eu não pudesse de fato superar de vez... não supero. 
Sinto uma saudade imensa ainda que estejam perto de mim.
Ainda que estejamos na mesma casa, 
eu estou sempre pensando na expressão de seus rostos, 
no que pensariam, 
porque reagiram de determinada maneira 
e o que podem pensar de mim... 
o que podem pensar de mim? 
Ah... que estranha versão de vocês guardo em meu peito...
que estranha saudade as vezes choro lembrando o que não é nem preciso esquecer...

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